segunda-feira, 23 de março de 2009

Che: Primeira Parte - O Argentino (Che: Part 1)

“O Argentino” não é a biografia de Che, é a biografia da revolução Cubana. Neste filme, Steven Soderbergh consegue esquecer-se do seu estilo, perder uma boa história e passar ao lado do cerne de uma personagem icónica que tinha tudo para cativar o público. Há quem espere pela segunda parte da obra para decidir se é boa ou má... Eu não tenho ilusões de que essa possa vir a salvar o emaranhado de batalhas e personagens sem história com que o realizador nos aborreceu nestas duas horas e picos de filme.
Benicio del Toro safa-se. Safa-se, não! Na verdade, é brilhante ao confundir-se com o ícone que estamos habituados a ver em t-shirts e bandeiras desde os tempos de liceu. Pena é que não lhe tenham permitido interpretar um Che com emoções genuínas, em vez de escrúpulos cirurgicamente estudados para nos dar a ideia de um homem recto e justo. Aquele Che é totalmente falso como ser humano. E Benicio não tem culpa disso.
Dissecando… O início do filme cheio de legendas escritas a branco - cujo objectivo é levar-nos de trás para a frente no tempo entre a Cidade do México dos anos 50, onde ainda apenas se discute a possibilidade da revolução, e a Nova Iorque de 1964, onde Che vai discursar nas Nações Unidas - em vez de nos deixar entrar serenamente na história, confunde-nos, chateia-nos e começa logo a colocar à prova a nossa paciência. Depois seguem-se uma série de imagens, sem história, em que Che já se encontra na selva Cubana a lutar por um país que não é o seu. A conversa com Fidel Castro, na Cidade do México, cronologicamente antecedente à decisão de se entregar à causa cubana, não nos explica quem é Che e porque é que um médico argentino com uma vida estruturada no México (que inclui mulher e filha) decide tornar-se guerrilheiro e lutar por uma pátria que não é sua. Não explica porque é que Ernesto Guevara tem uma mente megalómana e quer levar a revolução “a toda a América”.
Este “Argentino” é cubano quase desde início, quando é aliciado por um Fidel Castro, mais jovem e efeminado, apresentado já como “a” esperança para uma Cuba oprimida pela ditadura de Baptista. Aliás, quem quer saber, com rigor, quem são aquelas personagens todas, é bom que leia bastante, que google diligentemente a história da revolução cubana antes de se deslocar ao cinema ou saíra de lá como entrou…
Em resumo… Não conhecemos o passado, as motivações, as questões morais nem as paixões desta espécie de homens rectos e determinados, que se vão confundindo e que nos vão levando através de uma sequência de batalhas, do mato para as cidades cubanas, enquanto se aproximam de Havana para perpetrar o famoso golpe de estado. Sabemos que são bravos soldados dedicados à causa e sabemos que Fidel vai estabelecendo acordos políticos com outros grupos rebeldes, cujas pretensões e ideias nos são apresentados em meros segundos, sem que fiquemos a saber se devemos prestar-lhes atenção ou se não mais vão interessar para a história. Aquela sequência de batalhas datadas interessarão, eventualmente, aos cubanos e menos aos milhões de fãs de Che e ainda menos aos que se deslocaram ao cinema dispostos a deixarem-se fascinar por esta personagem marcante.
A luz surge após hora e meia de filme (ou coisa que o valha), quando a batalha está à porta de Havana e uma personagem feminina surge para nos questionar acerca do futuro amoroso de Che. Não é apenas ela que o consegue, mas é neste ponto da história que começa a haver um envolvimento emocional com o público, que começa a haver uma coerência naquela retrato e uma identificação mais segura das personagens. Mas é, sem dúvida, tarde demais...
…Continuo à espera de perceber quem era Ernesto Guevara. Mas já perdi a esperança de ter Soderbergh a elucidar-me. Será que me vou dar ao trabalho de ir ver se me enganei?


Classificação:
**