Holmes irreverente
Com potencial para se transformar em franchising ( a sequela está em desenvolvimento de acordo com o IMDbPro), o Sherlock Holmes de Guy Richie é brilhantemente explorado pelo fabuloso Robert Downey Jr. Apesar de ser um blockbuster digno de tal nome, o melhor do filme é, sem dúvida, a renovada personagem e a interpretação que Downey lhe dá. Que o homem é um dos actores mais talentosos da sua geração, já sabíamos (pena que se perdeu durante uns anos nos caminhos tortuosos das drogas, tendo sido um dos poucos habitantes famosos de Hollywood a pagar por isso com sentença de prisão, mas adiante…), o que não esperávamos (ou pelo menos, EU não esperava) era que ele se deixasse seduzir por filmes mais comerciais e, ao fazê-lo, conseguisse transformar personagens mais ou menos lineares e pouco desafiantes em figuras densas e com várias “camadas” de emoções.
Fê-lo no “Homem de Ferro” e consegue fazê-lo no filme espectáculo de Guy Richie. Está, talvez, na altura de lhe darem um papel em que consiga ganhar um Óscar, já que, com “Chaplin” (1992), ficou-se pela nomeação. Holmes não chega para isso. Não tanto pela falta de densidade da personagem ou pela falta de empenho do actor (o filme tem das duas de sobra!), mas porque é um “herói de acção” e a Academia prefere oscarizar personagens biográficas, loucas ou esquizofrénicas. E, por isso, temos pena. O Holmes de Downey foi das melhores interpretações do ano! Merece, por isso, a nomeação para um Globo de Ouro na categoria de Melhor Actor Principal em Filme de Comédia ou Musical.
Sim, o Sherlock Holmes de Guy Richie é um “herói de acção”, em vez do gentlemen inglês sisudo que pode ter tido sucesso noutras épocas, mas que, nos anos 2000, em que o destaque vai para o individualismo e o exacerbar das características pessoais, seria olhado de lado e com a benevolência do respeito pelo “clássico”! Os blockbusters fazem-se com personagens irreverentes e não com “respeito”, por isso, Richie e a sua equipa de escritores (são cinco, sem contar com Sir Arthur Conan Doyle, autor da personagem), foi aos arquivos encontrar as características mais recônditas de Holmes e conseguiu – jurando que se manteve fiel à descrição da personagem nos primeiros livros de Sir Conan Doyle – encontrar um perfil sexy, dinâmico e exuberante, condizente com os heróis de acção dos dias de hoje. A única verdadeira liberdade criativa – dizem os criadores do lifting de Holmes – foi no rejuvenescimento de Watson, que se transformou num jovem apaixonado que atura o desmazelado detective apenas por este trazer aventura à sua vida.
Watson rejuvenesceu com o objectivo de dar mais dinamismo à fita e à figura principal do filme e encarnou no sex symbol Jude Law, que apesar de ter um talento discutível, deixa-se aqui contagiar pelo génio de Bob Downey e dá ao herói o que ele precisa: um side kick perfeito, aquele que é adjuvante da acção sem ensombrar o génio da personagem principal.
O conjunto é um filme dinâmico e luminoso, com personagens marcantes e sempre com o ritmo em crescendo, o que o torna um sério candidato a transformar-se numa série de filmes ao estilo Bond, com Holmes a explorar o glamour e as belas mulheres da fascinante Londres do séc. XIX.
Rachel McAdams e Mark Strong merecem uma última nota. Intensos, sem se transformarem em caricaturas, são dois actores a ter em atenção para futuros papéis, talvez mais exigentes.
Classificação:
****